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COTIDIANO

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MARIA ELISA AMORIM  E SUA INTRÉPIDA TROUPE

 HAYDEÉ SILVA *

Está lá no bom e velho dicionário Aurélio, preciosidade-antiguidade nesses tempos de Google, que não desisto de manter na estante: intrépido:  que não possui medo; que não teme o perigo; corajoso. Figurado. Que é obstinado; que não se abate diante dos obstáculos.

s.m. Indivíduo que não tem medo; corajoso.
(Etm. do latim: intrepidus.a.um)

E não há outra palavra para qualificar o trabalho conjunto de Maria Elisa Amorim e um grupo de atores, responsáveis pela encenação de A Escola do Escândalo, no começo do mês de outubro no nosso glorioso  Teatro Celso Peçanha. Por que intrépido? Porque é preciso não ter medo, é preciso não recuar diante de obstáculos para gastar horas  de um tempo precioso decorando texto, estudando composição de personagens, adaptando uma peça  de mais de cem páginas para caber em duas horas de espetáculo. É preciso coragem, gente, para passar dez meses “gestando” em grupo uma peça de teatro pelo simples prazer de...representar!

Porque o “cachê”, no glorioso Teatro  Celso Peçanha, na maioria das vezes vem em forma de aplausos. São amadores, na maioria das vezes, os atores que sobem ao palco e nos brindam com espetáculos que  nos fazem esquecer que estamos em Três Rios, tal o nível de profissionalismo, tal o capricho nos figurinos, o talento do elenco e o esmero da direção, da técnica, da contra regra. Tal qual nos grandes teatros das grandes cidades, a gente “viaja” durante duas horas, e quando a cortina se fecha e as luzes se acendem, voltamos para casa felizes e surpresos, de ver que também na pequena (?) Três Rios se faz teatro do bom.

E a mágica mais uma vez se repetiu durante a mini temporada de Escola de Escândalos. Texto do século XVIII, temática tão antiga quanto atual, apenas o grau de maldade dos disse-me-disse destoa, visto que hoje fala-se mal da vida alheia com muito mais virulência. Mas fofoca existe desde que se juntaram dois ou mais seres humanos numa roda de conversa, e a peça de Richard Sheridan não é considerada a toa um dos melhores espetáculos do gênero (comédia de costumes)  de todos os tempos.

Encenada pelo elenco  dirigido por Maria Elisa Amorim, a peça começa morna, duas “damas” destilando pequenas doses de veneno numa conversa  que não chega a arrancar risos. Mas são duas horas de espetáculo, e lá pelos 30 minutos a gente começa a “entrar” na história. Pelos  luxuosos salões da época, começam a desfilar tipos cada vez mais comprometidos uns com os outros, a mulher mais jovem casada com o velhote (impagáveis na cena em que o amante se esconde sob a saia!) e o trai com um homem mais jovem;  os sobrinhos empenhados em arrancar dinheiro do tio que há anos não vêem; as fofoqueiras que entram e saem de cena trazendo a cada hora detalhes mais picantes sobre algum assunto.

Em seu perfil no Facebook Maria Elisa se intitula “aprendiz de roteirista”, mas essa qualificação precisa ser mudada. Embora concorde que a gente aprende todo dia uma coisa nova, com a apresentação de Escola de Escândalos acho que ela  provou que mudou de categoria; não é mais uma aprendiz,  e sim uma roteirista. E a julgar pela garra, vontade de trabalhar e  destemor para enfrentar obstáculos, ainda tem muito o que mostrar no palco do nosso teatro, e talvez até em outros , por que não? Afinal, ousadia não lhe falta.

Resumindo: um ótimo espetáculo, com ótimos atores, uma adaptação que não fugiu ao estilo da época e  apresentava as cenas de forma bastante interessante, o que ocorria também com as mudanças de cenários, feitas com as cortinas abertas, à vista do público, sem que isso atrapalhasse a atuação dos atores.

No final, a plateia ri muito, aplaude muito e se levanta para homenagear os atores na cena final, uma elegante valsa coreografada por Lucas Steinert, que também faz parte do elenco. Citar destaques seria injusto. Todos se empenharam e deram o melhor de si pelo bem do espetáculo. O êxito é coletivo, num grupo heterogêneo, de idades diferentes, tipos físicos diferentes e, certamente, objetivos de vida diferentes.  Talvez nem todos os que subiram ao palco pretendam  fazer da arte profissão, mas certamente já fazem do teatro uma escola onde aprendem e ensinam, se divertem, riem e choram, uma troupe destemida que tem nos aplausos finais o seu maior cachê.       De resto, não resisto  à tentação de destacar as atuações de  Nicole e Pietro do Valle, os caçulas do grupo, alunos de Maria Elisa,  nosso teatro  recebendo mais uma geração  de amadores amantes  da arte de representar. Muito bons os dois irmãos!

Aplausos para os figurinos, caprichadíssimos, para os cenários, para toda a equipe que fez de Escola de Escândalos um sucesso que merece voltar à cena. Quem gosta de teatro e não viu tem que ver para crer. É teatro do bom, em Três Rios, feito por amadores.  É gente destemida,  que merece ser aplaudida de pé.

Elenco:   Denise Maia, Rouse Santana, Iago Almeida,Wesley Altino,Yanca Werneck,Caroline Gama, Lucas Steinert, Alexandre Braga, Fabio Ghaspar, Nicolly do Valle, Pietro do Valle, Juliana Marques e Diego Fonseca.

Ficha técnica: Adaptação, direção e produção Maria Elisa Amorim; direção, figurino e cenografia: Denise Xavier; valsa final:  Lucas Steinert; operadores de som e luz: Dinho Kojiro e Walter Matheus; contra regras: João Pedro e Vinícius Mello; secretária e aderecista: Estéfane Motta.

* Jornalista