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GENTE/ DR MIGUEL DA COSTA E SILVA FILHO

GENTE/ DR MIGUEL DA COSTA E SILVA FILHO



"O SUS  É UM GRANDE PROJETO CHEIO DE PROBLEMAS"

Para marcar a passagem do Dia do Médico, comemorado no último domingo (18), a reportagem do TR Revista conversou com o Dr. Miguel da Costa e Silva Filho, o mais antigo integrante do quadro de profissionais do SUS em Três Rios. Com 39 anos de serviço público, o piauiense que chegou a Três Rios em 1976, foi discípulo do renomado Dr. Ribeiro Netto, cirurgião reconhecido internacionalmente, e considera o Sistema Único de Saúde como “um grande projeto, atualmente atingido pelo descalabro provocado pelo financiamento precário, controle social ineficiente e precariedade no atendimento dos Postos de Saúde da Família”.

TR – Quando e por que o senhor decidiu que queria ser médico?

 DR. MIGUEL – A  decisão de ser médico foi da minha mãe. Na realidade, eu queria era ser bancário, e na época me matriculei em um concurso para o Banco do Brasil. Fiz cursos de datilografia e matemática financeira. Nessa época, tinha 17 anos.

TR – Onde e quando se formou?

DR. MIGUEL – prestei vestibular para a Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará e fui aprovado logo de cara, em 1967, terminando o curso em 1972.

TR – Onde o senhor nasceu? Há outros médicos na sua família?

DR. MIGUEL – Sou orgulhosamente nascido em Teresina, capitado do Estado do Piauí. Somente eu quis seguir a carreira de médico. Tenho dois irmãos engenheiros.

TR – Como e quando chegou a Três Rios?

Dr. MIGUEL – Cheguei a Três Rios em 1976, pelas mãos do Dr. Antônio Ferreira Ri beiro da Silva Netto, o Dr. Ribeiro Netto, cirurgião de tórax reconhecido nacional e internacionalmente. Trabalhamos juntos no Hospital dos Servidores do Estado, no Rio de Janeiro (antigo Ipase), e também aqui no Hospital de Clínicas Nossa Senhora da Conceição, na época um grande hospital, referência para a Região Serrana e também para a Região Centro Sul do Estado do Rio de Janeiro. Infelizmente, o Dr. Ribeiro Netto faleceu precocemente. Aqui fazíamos congresso, jornadas, reuniões científicas etc, com a participação de notórios médicos do antigo Estado da Guanabara.    

TR – Há quantos anos atende no serviço público?

DR. MIGUEL – Desde 1976. Quando desembarquei em Três Rios, fiz concurso público para o antigo Inamps, sendo aprovado em terceiro lugar. Prestei também outro concurso, também para o Inamps, em 1984, sendo aprovado em primeiro lugar, fato do qual muito me orgulho. Por conta disso trabalhei 18 anos no Hospital Alcides Carneiro, em Petrópolis.

TR – E qual a sua opinião sobre o SUS? Em todos esses anos em que atende pelo sistema, qual a sua opinião sobre o mesmo? O que melhorou, e o que piorou?

 O Sistema Único de Saúde é, na realidade, um grande projeto, criado por  um grupo de grandes médicos especialistas em medicina social (sanitaristas), incluindo o Dr. Hésio Cordeiro (ex-Presidente do Inamps) Dr. José Gomes Temporão (ex-Ministro da Saúde), Dr. José Paranaguá de Santana (piauiense como eu),  Dr. Sérgio Arouca e muitos outros.

Na realidade, o Sistema avançou e venceu todas as instâncias administrativas e jurídicas, empacando na questão política. O descalabro que assistimos hoje se deve a isso: financiamento precário, controle social ineficiente, precariedade no atendimento dos PSFs e outros problemas. O SUS foi copiado do modelo de assistência médica de Cuba, onde funciona adequadamente, com sistema de referência e contra referência funcionante e distritos sanitários, assegurando hoje uma das menores taxas de mortalidade infantil do mundo, cerca de 8%.

TR – Quantos filhos o senhor tem? Algum deles é médico?

DR. MIGUEL – Tenho dois filhos. Um deles é médico.

TR – Para o senhor, quais foram as maiores conquistas da medicina nos últimos anos?  

DR. MIGUEL – Foram muitas, em todas as áreas.  Houve um avanço extraordinário da medicina no Brasil e no mundo todo, com a inclusão da informática na área médica de modo abrangente. Procedimentos que antes eram realizados a céu aberto, passaram a ser realizados com invasão mínima (cirurgias endoscópicas, cirurgias cardíacas, ortopédicas, procedimentos cardiológicos e vasculares, entre muitos outros), assim como um grande avanço na área de medicamentos para todas as especialidades médicas, além do desenvolvimento de um grande número de vacinas.

Tenho lido artigos que relatam que a medicina avança rapidamente para um modelo de assistência médica com atenção meramente domiciliar de boa qualidade e resolutividade, barateando enormemente o curso do tratamento de diferentes doenças e renegando a assistência hospitalar para casos selecionados.

TR – Há alguns anos o senhor foi candidato a vereador. O que o levou a se candidatar, e por que não continuou na política?

DR. MIGUEL – Sou muito idealista. Acredito na ajuda do homem para com o seu semelhante menos favorecido. Esse tipo de político não faz carreira. É severamente combatido pelos seus pares e cai no ostracismo.

TR – Aceitaria um convite para concorrer novamente a um cargo eletivo?

DR. MIGUEL – Não penso nisso.

TR – Se tivesse que mudar de profissão, qual carreira escolheria?

DR. MIGUEL – Ser médico.

TR – Qual a sua opinião sobre o programa Mais Médicos?

DR. MIGUEL – Não acho que foi uma boa ideia. Temos muitos bons médicos em todo o Brasil. Todos eles muito qualificados e interessados em ajudar a nossa população carente e em áreas de difícil acesso. Acho que esse programa é meramente político. Não vejo necessidade de que médicos estrangeiros venham trabalhar aqui no Brasil. As regiões de difícil acesso, que serviram como explicação para a implantação do Mais Médicos, embora haja muitos médicos cubanos contratados para trabalhar em grandes metrópoles, são bem aceitas pelos médicos brasileiros, desde que haja condições mínimas de trabalho. Dizem que primeiramente os médicos brasileiros foram convidados a participar do projeto. Haveria uma aceitação maciça por parte de todos eles, desde que lhes fossem oferecidos plano de carreira, cargos e salários e condições mínimas para executarem o seu trabalho. Com isso, ganhariam os atuais governantes e o povo brasileiro. Basta que apresentem um projeto dessa natureza, que a questão se resolve rapidamente e com muita tranquilidade.

TR – O senhor apoia o movimento pela redução dos salários dos vereadores? Por quê?

DR. MIGUEL – Dei o meu apoio. Não acho justo que um pe1ueno colegiado decida sobre o aumento dos seus vencimentos, principalmente na atual conjuntura em que vivemos. Embora consubstanciados em lei, e sendo um poder legalmente constituído, acho isso um privilégio descabido, pois temos várias categorias de funcionários públicos do município, entre os quais os professores, os médicos, técnicos de enfermagem, pessoal da segurança, pessoal da limpeza etc, que não têm acesso a  procedimentos deste tipo: eles próprios aumentarem seus próprios salários. Ouço falar que o próprio Prefeito do município, meu primo Vinícius Farah resolveu diminuir o seu salário, fazendo o mesmo com algumas gratificações do funcionalismo, sensibilizado pelo momento de grande aperto pelo qual passamos. Eu o parabenizo por isso.

TR – Qual é, na sua opinião, o maior problema do Brasil atualmente?

DR. MIGUEL – A corrupção em todas as esferas do poder; Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas considero o momento atual de grande significado, pois tudo está sendo mostrado pela imprensa, os responsáveis devem não só devolver o que receberam ilicitamente, mas também pagar caro na cadeia.

TR – Qual a mensagem que deixaria para os jovens que acabam de receber o diploma de médico?

DR. MIGUEL – Que eles pensem numa especialidade. Hoje os cursos de graduação em medicina não garantem segurança e conhecimento para o bom desempenho da profissão. Que acrescentem aos seus anos de formação médica mais outro tanto para que consigam dominar com segurança uma especialidade qualquer. Estamos muito necessitados de clínicos. A clínica médica é a mais notória de todas as especialidades médicas, pois domina todas as outras subespecialidades. O acesso a uma especialização pode ser feito através de residência médica (a melhor forma), ou cursos de pós-graduação. Que os jovens recém formados cheguem ao mercado com esses títulos, pois ganharão reputação e reconhecimento como bons profissionais.