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GRIPE E RESFRIADO: AFINAL, QUAL É A DIFERENÇA?

GRIPE E RESFRIADO: AFINAL, QUAL É A DIFERENÇA?



As repentinas mudanças de tempo nos últimos dias mexeram com a saúde de muita gente. E uma velha dúvida reapareceu: afinal, o que é gripe e o que é resfriado? Em busca de resposta, selecionamos alguns trechos da entrevista do médico João Silva de Mendonça, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e membro do corpo clínico do  Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo,  onde dirige o Serviço de Moléstias Infecciosas. Em conversa com o Dr. Drauzio Varela, ele  prestou importantes esclarecimentos aos gripados e resfriados deste confuso inverno brasileiro.

Segundo o Dr. João, nem todo espirro é sinal de gripe. Os brasileiros geralmente costumam encarar a gripe como uma doença banal, o que não é verdade. Em crianças, pessoas idosas ou imunodeprimidas, pode ser uma moléstia grave e até causar a morte.

Gripes e resfriados são doenças virais, e vão muito além de um simples espirro. Embora os sintomas sejam semelhantes, os da gripe são bem mais intensos. O médico cita uma forma bem prática para distinguir uma doença da outra: se a pessoa conseguiu ir trabalhar apesar do nariz escorrendo, do peso na cabeça e da irritação na garganta, não está com gripe, está resfriada. A gripe “derruba” a pessoa, impedindo-a de sair da cama, sem a menor condição física de sair de casa e trabalhar.

 Dr. Drauzio – Como distinguir os sintomas da rinite alérgica e do resfriado?

 Dr. João Silva de Mendonça – A rinite alérgica é muito comum em cidades grandes  por causa dos alérgenos soltos na poluição ambiental. Os sintomas se manifestam especialmente no nariz que fica obstruído, com secreção, entupido, como se diz vulgarmente, e a pessoa espirra várias vezes durante certo período de tempo.

No resfriado, os sintomas são parecidos com os da rinite alérgica, mas vão além. Ele pode vir acompanhado de uma faringite branda, ou seja, uma leve dor de garganta (o paciente diz que a garganta arranha ou arde um pouco), uma discreta febrícula (37º e fração) e um pequenino mal-estar. Quem está resfriado apresenta essa sintomatologia durante três ou quatro dias e ela vai desaparecendo espontaneamente; quem está resfriado não interrompe suas atividades, sejam elas de caráter físico ou intelectual. Apenas o desconforto do nariz incomoda e exige pausas para a higiene nasal adequada.

Dr. Drauzio – E os sintomas da gripe, quais são?

Dr. João Silva de Mendonça – Na gripe, o quadro é diferente. A pessoa obrigatoriamente tem febre,  que não ocorre em picos isolados e ultrapassa 38,5º, às vezes chegando aos 40º. Quem está com gripe fica vários dias com febre e tem um comprometimento geral importante. Dores no corpo, popularmente descritas como quebradeira, sensação de mal-estar muito intensa, cabeça levemente torporosa comprometem a atividade física e intelectual.

E mais: o vírus da gripe não se manifesta apenas na rinofaringe, mas em toda a árvore respiratória, ou seja, na traqueia, brônquios e eventualmente nos pulmões. Portanto, trata-se de uma doença de maior extensão e intensidade, sobretudo para as pessoas debilitadas. A gripe pode causar complicações graves e, eventualmente, morte, o que não ocorre nos casos de resfriados e rinite alérgica.

Dr. Drauzio -  O resfriado é uma doença provocada por inúmeros  vírus. Há mais de 200 vírus implicados nesse processo infeccioso.

Dr. João Silva de Mendonça – Entre os vírus que provocam resfriado, estão os rinovírus (só este grupo tem mais de 100 tipos diferentes), os coronavírus e alguns dos mais antigos e conhecidos vírus da medicina.

Somando todos os que provocam resfriados, existem algumas centenas de vírus de sorte que, no transcorrer da vida, podemos ser acometidos por dezenas ou talvez por mais de uma centena de resfriados. Contra esses vírus, vamos adquirindo imunidade, mas permanecemos com potencial para desenvolver a doença se entrarmos em contato com qualquer um dos demais.

Dr. Drauzio  Por isso as crianças têm mais resfriados do que os adultos?

Dr. João Silva de Mendonça – Elas têm mais resfriados porque não são imunes, ou seja, ainda não adquiriram defesas específicas contra esses vírus. À medida que vão crescendo, adquirem imunidade contra parte deles e o número de episódios diminui, embora o resfriado possa manifestar-se do nascimento à velhice, em qualquer faixa etária.

Dr. Drauzio – Você falou da influência do frio no aparecimento dos casos de gripe. Isso para as mães é um terror. Elas agasalham em demasia os filhos e, de todas as formas, procuram evitar que saiam no sereno ou tomem vento, especialmente vento encanado nas costas. Na verdade, gripes e resfriados são doenças virais. Se não existir o vírus, não há vento nem frio que faça uma pessoa pegar gripe, não é verdade?

Dr. João Silva de Mendonça – Na transmissão da gripe, o problema não é o frio propriamente dito, mas as aglomerações que se formam em ambientes fechados quando baixa a temperatura. A proximidade entre as pessoas facilita a transmissão do vírus. Portanto, o frio não é causa da gripe, apenas cria condições para maior disseminação do vírus em lugares não ventilados onde as pessoas tossem, espirram, ou falam muito perto umas das outras.

Dr. Drauzio  Já que as gotículas de saliva ou de secreção respiratória que eliminamos quando falamos, tossimos ou espirramos carregam o vírus da gripe, qual a distância segura entre uma pessoa e outra para evitar a contaminação?

Dr. João Silva de Mendonça – Nas doenças de transmissão respiratória em que a partícula que transporta o vírus é pesada – e isto é uma regra não só para gripes e resfriados – o natural é ela se precipitar e pousar no solo como rege a lei da gravidade. Para que alcance outra pessoa, é preciso que a proximidade entre ela e a que transmitiu o vírus pela tosse ou pelo espirro seja menor do que 90cm ou 1m.

 

Dr. Drauzio – É costume entre os brasileiros, numa reunião social, a pessoa gripada ou resfriada afastar o rosto para não ser beijada e oferecer a mão, gesto protetor mas pouco eficiente para evitar a transmissão do vírus.

Dr. João Silva de Mendonça – Esse é um dos muitos conceitos arraigados no ideário popular que demonstram falta de conhecimento sobre o mecanismo de transmissão do vírus.

A mão pode ser veículo de transmissão do vírus não só da gripe e do resfriado, mas de outras moléstias infecciosas. Não há como fazer uma higiene cuidadosa da secreção nasal sem contaminar as mãos. A não ser que sejam lavadas cuidadosamente cada vez que a pessoa assoa o nariz, o vírus fica viável durante algum tempo e passará no aperto de mão para outra pessoa que, sem querer, coçará o nariz e fechará o ciclo.

Dr. Drauzio – O que se faz é exatamente o oposto do que deveria ser feito. Seria melhor dar um beijinho no rosto do que apertar as mãos. Há algum outro hábito que se possa adotar, para evitar o contágio?

Dr. João Silva de Mendonça – Há outro hábito cuidadoso que deveria ser sempre respeitado. Ao tossir ou espirrar, a pessoa deveria afastar-se e cobrir a boca e o nariz com um lenço para evitar a disseminação do vírus entre os presentes.

 

Dr. Drauzio – Como a pessoa deve agir quando está com gripe ou resfriado? Tem gente que toma injeção, xarope e outros medicamentos. Isso resolve?

Dr. João Silva de Mendonça – Felizmente, o hábito de procurar uma injeção para aliviar os sintomas respiratórios quase desapareceu por completo. Na verdade, o que o indivíduo com gripe precisa é de repouso e boa hidratação oral para umedecer as secreções a fim de que sejam mais facilmente expelidas. Além disso, deve buscar alívio sintomático. Pode tomar analgésicos e antitérmicos, com recomendação para evitar o ácido acetilsalicílico e dar preferência ao paracetamol e à dipirona, se tiver febre e dor. Pode também usar descongestionantes nasais para afastar o desconforto do nariz obstruído e, na fase de tosse produtiva, xaropes que fluidifiquem a secreção para facilitar sua eliminação.

Dr. Drauzio – A hidratação é fundamental. Muito do mal-estar da gripe e resfriado pode ser atribuído à má hidratação. A pessoa tem dor de garganta e deixa de tomar líquidos.

Dr. João Silva de Mendonça – É isso mesmo. E não é só a dor de garganta que influi. A febre alta aumenta a perda de líquido pela transpiração. Por isso, a pessoa tem de se cuidar e hidratar-se adequadamente. Pode ser com água, sucos e outros líquidos que, além de boa hidratação, deem um mínimo de suporte calórico.

 

Dr. Drauzio – Os laboratórios promovem extensa publicidade na mídia sugerindo que a vitamina C previne gripes e resfriados. Qual é sua opinião sobre o assunto?

Dr. João Silva de Mendonça – Toda a investigação metodologicamente conduzida com vitamina C para evitar a gripe ou aliviar seus sintomas apresentou resultados negativos. Ou seja, a Medicina não conseguiu dar suporte científico para essa indicação. A última revisão metodológica sobre o assunto saiu publicada há poucos anos numa revista de enorme prestígio na área médica, a New England Journal of Medicine, da Universidade de Harvard, em Boston (USA) e a conclusão foi a mesma: não foi encontrado fundamento sólido que justificasse indicar vitamina C nos casos de gripes e resfriados. (fonte: http://drauziovarella.com.br/audios-videos/estacao-medicina/gripes-e-resfriados/)