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NO MEU QUINTAL, UM TESOURO!

NO MEU QUINTAL, UM TESOURO!





Nesses tempos de notícias meio apocalípticas,  de previsões sinistras sobre o fim da água, estudos pessimistas sobre a finidade das nossas fontes, um turbilhão de preocupantes vozes de Cassandras .
E foi à motivação desse apavorante cenário de desidratação global que, numa roda  de conversa sobre o assunto, patati -patatá, fui despertada para uma  riqueza quase ignorada: no meu quintal tenho um tesouro - um poço ! Embora interditado por uma grossa laje encoberta pela vegetação, meu poço continua cheinho d’água! Socorrista em riscos de desabastecimentos!
Na verdade a existência de poços nas residências trirrienses era muito comum, não obstante o distrito já se orgulhasse,  em 1922,  contar com um serviço de abastecimento d’água. O liquido era bombeado de dois grandes tanques que recebiam as águas então cristalinas do riacho Purys, vindas das bandas do hoje populoso bairro do mesmo nome. Esses dois grandes tanques ficavam no então chamado “ Jardim das Águas”, um aprazível recanto que teve vida até os meados dos anos 30,  posicionado onde hoje se encontra a 108ª Delegacia de Polícia , no bairro Portão Vermelho. Foi um serviço público que cumpriu medianamente seus objetivos, com um atendimento de não mais de 150 residências, quase todas representantes de classes sociais mais privilegiadas.
Foi em 1942, com Três Rios já município, que foi inaugurado um segundo serviço de abastecimento, com águas captadas do rio Paraíba do Sul. Essa obra, que contou com investimentos do governo do Estado do Rio de Janeiro , foi considerada um espetacular avanço para a cidade. Sua estação ficava no então chamado “ morro do hospital”, hoje “ morro da CTB”, e suas instalações ainda podem ser vistas.
Já no início dos anos 60,com um considerável aumento populacional,  esse serviço supracitado já mostrava ser insuficiente para atender ao consumo crescente. Eram constantes as interrupções no fornecimento,  e temido um colapso no abastecimento. Foi daí, dessa urgência urbana, que a partir de 1967 tiveram inícios os primeiros traçados para a criação do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Três Rios – SAAETRI – uma autarquia que, inaugurada, já em 1970 fazia a ousada promessa de água tratada em abundância até o ano 2000!
O SAAETRI representou inquestionável revolução no urbanismo trirriense. Seus benefícios não se limitaram apenas aos seus fins propostos, acarretando  também uma importante expansão às diversas políticas públicas : saúde, educação, indústria, comércio, densidade demográfica, entre outras. Tamanho o seu alcance político -social , o SAAETRI ainda é considerado a maior obra da História de Três Rios.
Com bom funcionamento, nosso serviço d’água tratou em seus anos subsequentes de ampliar seu raio de ação todavia,  o correr do tempo lhe foi perverso, trazendo uma frustrante irregularidade de atendimento. Em crise ou não, tem o SAAETRI o mérito de que a segurança da sua criação veio aposentar os poços das residências, como também a faina das lavadeiras de roupas às margens do Paraíba, momento de labor folclórico, ainda em meu lisonjeiro testemunho ocular.
A lembrança do poço no meu quintal, obrigatoriamente remete à citação de que em especial, o centro da nossa cidade conta com considerável número de poços, ainda em áreas salvas da especulação imobiliária, com o esticar de grandes prédios e consequente aterramento dos poços encontrados. Quiçá, o mais lamentável desses aterramentos tenha sido o do grande poço que existia exatamente onde hoje se encontra o seio do andar térreo do Shopping Três Rios. Essa fonte d’água, originalmente, teve uso quase exclusivo para dar de beber aos animais de tração que serviam à Estrada União e Industria, já a partir de 1858. Extinta a estação da rodovia o citado histórico poço sobreviveu por aproximadamente quase 70 anos no local, sendo os últimos 40 nos então jardins da construída residência da tradicional família Mansur, desaparecendo quando das obras de construção do referido shopping, ao início dos anos 90
Essas fontes remanescentes, na roda de conversas, começaram assim a ser listadas ao avivar das memórias: um grande poço – sob a unidade da UPA, no bairro do Triângulo - que já ao início do século XX abastecia as locomotivas da Estrada de Ferro Leopoldina. Outro grande poço ,talvez dos anos 30, que serviu à família Torno, na atual área de estacionamento de veículos recentemente ampliado do Hiperpermercado Bramil. E assim, poços resgatados às lembranças, outros e mais outros, entre eles, o meu.
Em pontual observação, tal tesouro em meu quintal, pelo lençol freático característico, que corre pela área central da cidade, me faz lembrar a advertência de minha mãe sobre a qualidade das águas desses poços do centro: são águas salobras, não próprias para o consumo, nem para higiene pessoal, muito menos para lavagem de roupas, contudo oferecem alguns importantes usos em limpeza doméstica e na utilização sanitária. Usos que, nesses tempos de ameaças de escassez, já representam utilizações de grande valia. Muita coisa !
Meu poço,meu tesouro! Certamente.

Foto - Jardim das Águas ( anos 30). Área da hoje 108ª Delegacia de Polícia -bairro Portão Vermelho -Entre Rios / Três Rios