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O SELFIE NAS REDES SOCIAIS

O SELFIE NAS REDES SOCIAIS



Octavia Cristina Barros*

Atualmente, parece que o sujeito vive do seu próprio espetáculo. O indivíduo somente passa a existir se ele gerar uma repercussão na rede social. Daí a ênfase dada ao selfie.
O culto à própria imagem torna-se mais perceptível a partir da exibição de selfies.Muitos acreditam que a condição essencial para fazer parte da sociedade é atualizar constantemente o seu autorretrato, visando a sua superexibição.O indivíduo se representa tal como seus membros (da rede social) creem que ele é ou deveria ser.
A individualidade versus coletividade muitas vezes chamou a atenção de Freud. Pensava sobre os aspectos individualistas dos sujeitos e da valorização do poder, da riqueza e do sucesso em o mal-estar na civilização.
Uma idealização da perfeição em detrimento da diversidade humana e do que realmente tem valor na vida.Essas idealizações levam os homens a se frustrarem diante da realidade que, na maioria das vezes, não é perfeita. Hoje existe quase um consenso sobre estarmos vivendo em uma sociedade de narcisistas e as consequências de uma sociedade egocentrada,   que se reflete nos perfis pessoais nas redes.
De certa forma,  as redes de relacionamento funcionam como um suporte de egos idealizados e fazem transbordar as fotografias selfies. São rostos geralmente felizes,  pessoas aparentemente bem sucedidas, onde existe pouco espaço para críticas e aprofundamentos sobre diversos temas.
Na contemporaneidade, o narcisismo se instala marcando a fragilidade do "eu" e a obsessão do indivíduo consigo mesmo. Os usuários de redes sociais tendem a expor as suas “identidades midiáticas” exaltando imagens perfeitas de si mesmos e evitando compartilhar aquelas mais modestas.
Ser belo é atender aos anseios da sociedade. A proliferação de imagens, na mídia eletrônica, de corpos e de sua boa forma, leva o indivíduo a "imaginar, a diagramar, a fantasiar determinadas existências corporais, nas formas de sonhar e de desejar que propõem.
A estimulação e a exaltação do corpo perfeito têm uma repercussão junto ao sujeito: leva-o a formar uma imagem de si próprio a partir da inserção de uma cultura narcísica, que impõe um ideal coletivo que deve ser seguido para que o indivíduo sinta que pertence à sociedade.
É nessa sociedade do espetáculo que os selfies ganham destaque. Postados nas redes sociais, eles são criados e manipulados para que os indivíduos se reinventem da maneira muito mais como gostariam de ser vistos, e muito menos como são.
Os autorretratos são tirados com o objetivo de serem expostos justamente para os usuários da rede social (que têm acesso ao seu perfil), enquanto vitrines humanas.
O que se percebe é, ao mesmo tempo, certa idolatria e certa vontade de aparecer na rede social. Por isso, nas redes sociais, o culto ao corpo encontra sua espetacular devoção. Isto revela um narcisismo desenfreado, o retrato do imediatismo da contemporaneidade, em que uma imagem vale mais do que mil palavras.
"A madrasta e o espelho – Rubem Alves
É assim que eu penso o amor. Amamos as pessoas não pela beleza que existe nelas, mas pela beleza nossa que nelas aparece refletida. O que é uma bela pessoa? É aquela em que nos vemos belos. Quando, ao contrário, o espelho encantado nos mostra uma imagem feia, vai-se o amor e o espelho ou é quebrado ou é colocado permanentemente num quarto de escuridão permanente. Não mais o queremos ver.
Narciso, eu penso, é o mito mais fundamental. Mais fundamental que Édipo. Narciso dá o tema fundamental. Édipo é uma variação, um desenvolvimento. A estória da Madrasta e do Espelho é uma combinação dos dois: primeiro, a relação de amor paradisíaco, Madastra e espelho. O amor acontecia na voz do espelho que dizia: “És a mais linda”. Depois, quando a relação de encantamento é quebrada pelo aparecimento de uma outra imagem, mais bela. E a Madrasta se vê, repentinamente, excluída do espelho. E fica malvada. Toda exclusão faz isto: desperta em nós uma imagem cruel e feia, que toma conta do corpo...
Por isto que somos mendigos de olhares. Olhos são espelhos. Cada encontro é um pedido: “Diz-me, espelho meu, haverá no mundo alguém mais belo que eu?”
Por isto nos enfeitamos, por isto escrevemos, por isto convidamos os amigos para jantares, por isto vamos a alegres reuniões de amigos, por isto se fazem atos heróicos, por isto se escrevem poemas, por isto se fazem gestos: todos são pedidos de reconhecimento da nossa beleza.
Entenderam por que gosto mesmo é da figura trágica da Madrasta? Porque ela revela o drama do amor, a sua alegria e a sua decomposição. Somos todos a Madrasta, em busca de uma bela imagem..."

*Psicóloga, especializada em Psicanálise, Saúde Mental e Dependência Química e Outros Transtornos Compulsivos – CRP 05/25598