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ORA...NÚMEROS!

ORA...NÚMEROS!



 Haydeé Silva*

Esta semana felizmente ninguém falou no assunto. Já estava enjoando ouvir todo dia no rádio e ver na televisão entrevistas e debates sobre a pesquisa do IPEA, segundo a qual a maioria de um grupo de entrevistados, 65 por cento, se não me trai a memória, achavam que mulheres usando roupas sensuais mereciam ser estupradas.

Depois de muitas matérias nos meios de comunicação, o desfecho, algo surpreendente e duvidoso: o IPEA reconhece que houve um ERRO, que a porcentagem real era de vinte e cinco por cento. E aí vem a pergunta: a ser verdade o erro, e não desculpa para encobrir coisa tão feia como o preconceito, será que foi a única vez em que erraram? Quantas falsas estatísticas não tivemos que engolir até hoje, desde que inventaram a tal pesquisa de opinião?

Desde o jurássico Ibope, que controla o que a gente assiste na televisão, até as pesquisas da época de eleição, os institutos que apontam quem está na frente, margem de erro para mais ou para menos, etc e tal, a verdade é que somos “controlados” por números. Assistimos no domingo ao programa tal ou qual, e na segunda-feira lá vem a tal pequisa, informando quem venceu a guerra pela audiência. Às vezes diferenças insignificantes, outras vezes índices avassaladores, como nos últimos capitulos das novelas globais.

E tome pesquisa! Os casados vivem mais, quem usa fio dental (aquele para limpar os dentes, não o biquini minúsculo...) vive mais, quem passa mais tempo de pé vive mais. No inverno todo mundo vai usar roxo, as galochas voltarão a ser “fashion” na época das chuvas, certa cidade fimdomundense tem impressionante número de gêmeos...Números, números, números! Determinam até o que a gente vai comer, e aumentam a venda de produtos nos supermercados. Querem ver a venda de certo legume disparar? É só aparecer no Globo Repórter uma matéria dizendo que pesquisas comprovaram que ele faz bem para o coração, para a memória, ou ajuda no desempenho sexual. Eu mesma confesso que já cansei de comprar coisas (batata yokan, carne de soja, semente de linhaça) que depois acabei jogando fora, por não ter a mínima idéia de como usar ou por ter perdido o entusiamo dias depois de ver o programa de televisão.

O pesquisador responsável pelos números errados divulgados pelo IPEA pediu demissão do cargo. E esta semana técnicos do IBGE também largaram o emprego, por não concordarem com o adiamento de uma pesquisa cujo tema esqueci. Dizem os colunistas políticos que o engavetamento do trabalho , injustificável na opinião dos agora desempregados, foi motivado por questões políticas. Este ano tem eleição, e não era conveniente que certos dados fossem revelados, dizem eles. Ah, então é assim? Divulgam o que convém e escondem o que pode prejudicar a eleição (ou reeleição, dizem que Dona Dilma tá com o índice de aprovação altíssimo...)? E nós aceitamos o que eles dizem, como bobos e manipuláveis que somos. Marionetes escravas do consumo, que compram esteiras para servir de cabine, porque as pesquisas informam que 10 por cento dos que fazem exercícios físicos têm mais chances de chegar aos 100 anos. Agora que o moço do IPEA confessou que errou, fico pensando em quantas falsas pesquisas já engolimos e acatamos, comprando coisas, votando em pessoas, assistindo programas e comprando remédios. O índice dos que condenavam as roupas sensuais foi desmascarado, mas e os outros?

O moço do IPEA pediu demissão e foi arranjar outra coisa prá fazer. Deve ter se cansado de sonhar que estava morrendo afogado em números e gráficos. Talvez vire agricultor e vá plantar batatas yokan, ou se torne representante de alguma marca de esteira eletrônica.

• Jornalista