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EZILMA TEIXEIRA RELEMBRA/O FENÔMENO NEUTRO

EZILMA TEIXEIRA RELEMBRA/O FENÔMENO NEUTRO



 

No dia 3 de outubro de 1958,   os eleitores de Três Rios iriam pela quarta vez escolher o seu prefeito e os seus vereadores. Naqueles idos já se formara uma espécie de tradição do município  ver eleito seu prefeito aquele candidato com grandes empenhos à causa autonomista.O que levara àquela espécie de crença popular e política fora a eleição sucessiva de três líderes emancipacionistas: Guilherme Bravo, João  Silveira e Joaquim Ferreira.

Assim, por aquele raciocínio eleitoral, liderava na bolsa de apostas o candidato Mário de Castro Reis, vereador reeleito que cumpria - tal no primeiro  -o seu segundo mandato com excelente desempenho parlamentar.Tinha como prova irrefutável da sua boa performance política o grande aumento de votos obtidos na  reeleição e, nesse mandato, Mário Reis foi o respeitadíssimo Presidente da Câmara onde a tônica obrigatória era a o decoro parlamentar conjugado com uma espécie de código de ética, aos quais os seus pares não ousavam ferir e o povo engrandecido aplaudia.Esse candidato compunha agora as fileiras do poderoso PTB, com o amparo do prefeito Joaquim Ferreira, vantagens que somadas ao seu passado de líder autonomista no distrito de Afonso Arinos sinalizavam para uma eleição fácil, sem esquecer que fora dele, em 1954 - originado  de um memorial contendo 350 assinaturas - o projeto vitorioso da criação do 5º distrito, então nascido com o nome Serraria, hoje município de Comendador Levy Gasparian.

Ao que tudo indicava, o candidato que poderia incomodar uma vitória fácil de Mário Reis era o xará, colega de Câmara, o vereador Mário Canellas Barbosa, revelação política das eleições de 55, campeão de votos naquele pleito, com invulgar capacidade de persuasão e concorrendo sob a égide da segunda força política representada pelo PSD, além de trazer no currículo experiência na administração municipal pelo tempo que serviu como Chefe de Gabinete da gestão de João Silveira. Independente de tamanhos atributos favoráveis à vida pública, Mário Barbosa fizera nome como excelente contabilista, aplaudido ator do teatro amador, teatrólogo, peça imprescindível do GATVC e professor do Colégio Entre-Rios que arrastava atrás de si uma procissão de alunos encantados com o seu  excelente desempenho na cátedra.

A candidatura de Guilherme Pereira Bravo, o consagrado primeiro prefeito constitucional de Três Rios, formidável soldado da campanha separatista, intelectual de fina verve, figura ilibada da sociedade trirriense, fazia crer ao povo  que  poderia, também, incorporar a tradição de ver eleito prefeito componente da liderança autonomista.Concorria sob a legenda do PDC.

Na panorâmica da presença desses três excelentes candidatos, eis que surgiu, emergido de um longo silêncio político de dez anos, o jovem vereador  da  Câmara de 47, Cesar Pereira Louro concorrendo pela UDN. Essa candidatura, a princípio, pouco veio abalar as estruturas das outras três do páreo para o executivo e essa despreocupação era fundamentada pela impressão do pouco talento e interesse à vida pública que Cesar Louro demonstrara no seu mandato de vereador.Na Câmara, a sua intenção política logo se arrefeceu, fazendo-o pedir licença do cargo por tempo indeterminado, o que se prolongou até o término do seu mandato, em 1950, provocando a convocação do suplente.

Quiçá, a campanha eleitoral de 1958 tenha sido aquela com maiores marcas na história do gênero pelos acontecimentos inéditos que trouxe e que deixou ainda bem vivo à lembrança de uma multidão  testemunha ocular.

Guilherme Bravo e Mário Reis, políticos tradicionais, não abandonaram suas antigas práticas de campanhas eleitorais de comícios nos redutos onde sempre lideraram, o corpo-a-corpo na distribuição das conhecidíssimas cédulas eleitorais e das indefectíveis visitas aos domicílios.A novidade ficava com o candidato Mário Barbosa (foto da época) que conquistando o voto da juventude fazia dessa um valioso cabo eleitoral que ia, inclusive, cabalando e modificando os votos dos pais para o seu nome.O grande frisson da época era os seus comícios, onde promovia verdadeiros shows de uma inovadora oratória, avessa  aos enfadonhos antigos modelos de palanque e que somados à sua irresistível simpatia transformavam aqueles eventos uma atração imperdível à massa eleitoral.Naqueles tempos  da conquista do campeonato mundial de futebol, onde encantara a todos a maestria das pernas tortas de um jogador brasileiro, não tardou que num paralelo comparativo ganhasse o carinhoso apelido de Garrincha da Palavra.Mais tarde, sua experiência naquelas eleições inspirou o teatrólogo Mário Barbosa a escrever peça que fez grande sucesso na ribalta e à qual deu o nome do carinhoso apelido que ganhara, fazendo grande legado à dramaturgia trirriense.

Visto os excelentes atributos político-eleitorais desses três candidatos restou ao candidato Cesar Louro, contabilista, pessoa de fino trato, nascido em tradicional família da região, encetar estratégia fulminante e inédita em Três Rios: o marketing eleitoral. Sua campanha recebeu os favores do patrocínio financeiro de seu pai, Carlos Simões Louro, importante e abastado pecuarista  que não poupou cruzeiros para fazer do filho prefeito.Daí a população do município viu-se do dia para a noite presenteada com brindes eleitorais sob a forma de lápis, carteirinhas para títulos, sacolas para compras e toda uma parafernália até então desconhecida.Como se não bastassem essas novidades, um encantador estupor coletivo: aviões teco-teco lançavam sobre a cidade chuvas coloridas de cédulas eleitorais!Contudo, a maior surpresa daquelas eleições marketizadas ficaria na introdução do gingle da propaganda política e que fez um sucesso avassalador.Uma musiqueta  bem rimava ouro com Louro no pedido do voto, com um potente estribilho que ganhou a cidade toda e que continha um breque  que contagiou os cantantes populares.Esse gingle insistentemente martelava  os ouvidos de todos com vários carros pelas ruas e, pelo que contavam os mais irreverentes, ficara de tal forma também no subconsciente de alguns familiares dos outros candidatos a ponto de serem flagrados cantando indolentemente: Vamos votar em Cesar Louro, para prefeito...

Além do seu inovador bombardeio da propaganda eleitoral contou em seu palanque, numa única e importantíssima participação, com a presença, em carne, osso e carisma político, do deputado federal Carlos Lacerda pedindo aos trirrienses votos para aquele candidato da UDN.

Compareceram àquelas eleições 10.655 votantes e uma abstenção calculada em 4,2%,com 270 votos em branco e 731 nulos. Presidiu aquelas eleições o juiz Décio Itabaiana Gomes da Silva e os resultados  vieram confirmar a importância do novo modelo de propaganda e publicidade nas eleições: Cesar Pereira Louro -3766 votos: Mário de Castro Reis -3110: Mário Canellas Barbosa -2438 e Guilherme Pereira Bravo -253.

Cesar, a exemplo do seu homônimo romano, veio, viu, venceu. Sua vitória viria, então, desfazer a espécie de tradição do município ser administrado por um daqueles que cerrara fileiras na luta pró-emancipação.Como o nome do prefeito eleito estava à margem da galeria dos reconhecidos nomes autonomistas não tardou ganhar, nascido do inconformismo de alguns derrotados, à guisa de depreciar, o dístico  O Fenômeno Neutro, lançado em veemente artigo publicado pelo Entre-Rios Jornal, todavia, numa inversão de objetivo, o rótulo passou aos tempos como César Louro encarnando toda uma fenomenologia de criativa revolução  da propaganda eleitoral.E foi.

A nova Câmara de Vereadores reelegeu cinco titulares, todavia, trouxe à cena política novos e talentosos nomes, com alguns deles permanecendo e robustecendo, por muito tempo, o cenário político de Três Rios: A UDN elegeu: Micheli  Félix-364 votos: Armando de Almeida-358: Hélio Carlos de Almeida-237: Waldyr Marinho Rego-206 (reeleito).O PSD reelegeu Geraldo Ribeiro de Carvalho-344 votos e  trouxe três novos vereadores: Joel da Silva Maia-322: Everaldo Nunes da Costa-264 e Moisés Machado de Araújo-196.O PTB tornou eleitos Octávio de Freitas-487 votos (reeleito e o mais votado): Francisco Rômulo Salzano-254 (reeleito) e Alberto da Silva Lavinas-272 e o PSP trouxe a dupla Wilson Francisco de Paula-204 e Belmiro José de Lima-177 (reeleito).

      A diplomação dos eleitos aconteceu no dia 30 de novembro de 1958 e foram empossados a 31 de janeiro do ano seguinte, no salão nobre da prefeitura.

    Por indicação de seu pai, Carlos Simões Louro, o novo prefeito nomeou seu Chefe de Gabinete o contabilista Celso Martins, cedido pela E.F. Central do Brasil  para o exercício daquela função, encerrada em 11 de novembro de 1960, quando terminou aquela cessão; em 6 de julho de 1961, surgiu o semanário Correio Trirriense que passou a dar sustentação política ao governo municipal, voz oposta ao Jornal de Três Rios, braço do PTB e ao Entre-Rios Jornal, que defendia as cores do PSD- órgãos de imprensa que fizeram forte oposição ao governo de Cesar Louro.Essa oposição  contou com o poderoso reforço de Arsonval Macedo que, desde 1955 assumindo suplência, fizera-se deputado estadual pelo PTB e João Pedro da Silveira, eleito deputado estadual nas eleições de 58, sob a indefectível sigla PSD.

Inusitada característica desse governo municipal, e que marcou  um tempo,  foi a inédita presença atuante da primeira-dama Déa Fonseca Louro  que -revivendo Almira Ribas e lideradas, nas eleições sulparaibanas de 1936 e Alva Coutinho, na primeira eleição trirriense de 1947- deu grande colaboração para a extinção dos bolsões machistas que ainda teimavam em existir, execrando a participação feminina  na vida política de Três Rios.Altamente politizada, Déa Louro, foi uma voz bem ouvida naquela administração, sem esquecer de capitanear um rol de importantes obras sociais.

O prefeito César Pereira Louro, concorrendo a uma vaga na Assembléia Legislativa afastou-se do governo no período de 22 de agosto a 6 de outubro de 1962, sendo substituído pelo vice-prefeito José Gregório da Fonseca, conhecido popularmente por Zely.Derrotado, retornou à prefeitura  cumprindo seu mandato até o final.

Seu governo foi marcado por grandes apertos financeiros uma vez que o governo estadual estava nas mãos do PTB (e depois do trágico falecimento o governador Roberto Silveira, ocupado pelo vice, Celso Peçanha, do PSD) que arrochava os repasses de verbas, contudo, Cesar Louro adquiriu novos caminhões para tornar mais eficiente a limpeza urbana, criou doze novas escolas municipais, melhorou as estradas rurais de Afonso Arinos e Areal e, nesse último distrito, promoveu  necessárias obras no seu cemitério.Reformou a antiga estação de tratamento d’água, expandindo o seu atendimento, calçou um grande número de ruas da periferia e inaugurou parque infantil na Praça São Sebastião.

 As eleições municipais de 1958, trazendo novo prefeito e novos vereadores, indubitavelmente,  vieram, a exemplo das administrações anteriores, colaborar em estilo e fórmula, para a formação do perfil da Três Rios atual e dos distritos, municípios hoje emancipados, e foram pródigas em deixar aos tempos novas idéias e  novos ideais políticos.